quarta-feira, outubro 22, 2003

Como o mundo é pequeno...

Na sequência do meu comentário ao texto de José Manuel Fernandes (vide abaixo o post "Abismal"), caí num pensamento circular que só sossegou aquando de uma pesquisa (que nem foi profunda, tudo apareceu "saltitante" para regalo e júbilo dos meus olhos)... pensei para mim, "será que estou a tirar conclusões precipitadas? A (não)-qualidade do texto é flagrante, mas será que foi um acaso, será que José Manuel Fernandes até escreve bem, fundamentado, não é one-sided person, será?".

Pois bem, deixo aqi isto. Se passasse o texto do Zé Manel (a partir de agora é assim que o chamo) e as respostas que se seguiram estaria a transformar este post num "Abismal II", por isso aconselho MUITO MUITO vivamente a lerem tudo que vale a pena, vou apenas colocar aqui o texto inicial e algumas respostas que me pareçam representativas.

Atenção que o editorial (Zé Manel -> editorialista) foi mesmo escrito pelo Zé Manel, simplesmente não foi mandado por ele mesmo para o site onde está publicada esta discussão.

"Hooligans", e Nada Mais
por José Manuel Fernandes, em 2001-06-17

Está a tornar-se numa rotina: cada vez que se realiza um encontro internacional de alto-nível, há distúrbios, as cidades ficam em estado de sítio, as primeiras páginas dos jornais enchem-se de fotografias de encapuçados que queimam bandeiras, vandalizam lojas ou destroem propriedade pública.

Este fim de semana em Gotemburgo não foi diferente. A única coisa que foi diferente foi que desta vez percebeu-se, de forma mais transparente, a verdadeira natureza dos que promovem a violência. Não era uma violência contra a polícia, já que a polícia sueca é talvez a mais contida do mundo, e voltou a dar provas de autêntico estoicismo ao limitar ao mínimo dos mínimos o uso da força. Não era também um protesto, mais um, contra os Estados Unidos, porque o seu presidente já tinha partido e as bandeiras queimadas foram as da União Europeia.


Houve violência em Gotemburgo porque - é preciso dizê-lo com toda a clareza - existe uma nova categoria de "hooligans" que, sob a diáfana capa de serem "contra a globalização", são na verdade contra o convívio democrático, ao mesmo tempo que cultivam o desacato com o mesmo fervor dos adeptos bêbados do futebol.


Tem havido algum pudor em tratar este fenómeno com frontalidade. Os nostálgicos de Maio de 68 tendem até a ver nestas manifestações sinais de uma nova ordem contestatária. Ou, em alternativa, tendem a desculpar os excessos de uma juventude "tão generosa".

É preciso quebrar esta lógica desculpabilizadora ou mesmo cúmplice. É preciso dizer que estamos perante bandos de manifestantes profissionais, que andam de cimeira em cimeira a testar novos métodos de provocar a polícia ou destruir restaurantes McDonald. É preciso dizer que os métodos que utilizam contaminam e desvirtuam outras causas legítimas que outros manifestantes gostariam de poder expressar.

Mas é preciso dizer mais. É necessário dizer que não têm razão. Que os ideais que defendem são totalitários ou, felizmente, inaplicáveis. Que quando atacam a globalização atacam-na por motivos errados, próprios de quem tem privilégios de rico a defender, não de quem realmente gostaria que os povos mais pobres saíssem da pobreza.

É necessário igualmente dizer que a maior parte destes "hooligans" nunca teve uma vida que saísse dos limites do egoismo mais atávico. Se os anarquistas de outros tempos possuiam uma respeitável ética do trabalho, estes "anarquistas" modernos tem antes orgulho em viver dos subsídios que lhes são pagos pelo Estado-social que tanto dizem odiar. E se os dirigentes estudantis de Maio de 68 eram capazes de mobilizar os seus colegas para uma greve geral, estes "militantes" de hoje seriam mais depressa expulsos das escolas por esses mesmos colegas por cheirarem mal.

As cimeiras são uma boa ocasião para que aqueles que não têm voz se dêem a ouvir. Havia milhares de manifestantes que genuinamente gostavam de o ter feito em Gotemburgo. Para sua desgraça também eles foram vítimas deste novo tipo de "hooligans". Esse é mais um motivo para deixarmos de ser vagamente nostálgicos e condescendentes para com grupos que apenas desejam aproveitar as liberdades da nossa civilização para, incivilizadamente, a minarem.

--------------------------fim de texto-

Agora a primeira resposta, que tenta repôr a verdade dos factos:

Manuel Baptista em 2001-06-17

Toda a "informação" que nos chega está permanentemente filtrada e deturpada pelos cães de guarda do capitalismo todo-poderoso.
Ocultam e deturpam a verdade intencionalmente. Querem uma prova disto? Aqui vai: O "Público" deu a notícia de que manifestantes anarquistas estavam a ser repelidos pela polícia ao tentarem tomar de assalto um liceu no centro de Gotemburgo. O que é que se passou realmente? A SAC (Central Sindical Anarco-Sindicalista sueca redsponsável pela contra-cimeira)tinha alugado à Câmara Municipal de Gotemburgo vários locais para os manifestantes e participantes em colóquios e conferências da referida contra-cimeira pudessem pernoitar. Um dos locais era o liceu Schiller. A polícia, ilegalmente, a meio da noite (cerca das 4.00 h. locais) invadiu os locais, bloqueando as cerca de 400 pessoas indefesas que aí pernoitavam. Multiplicaram-se os actos de intimidação e de violência por parte da polícia em relação a muitos manifestantes. Foram realizadas prisões arbitrárias e não motivadas por comportamentos ilegítimos dos manifestantes. Foram impedidos de chegar a Gotemborg centenas demanifestantes vindos da Dinamarca, apenas com o "pretexto" de que eram anarquistas. Onde está a legitimidade "democrática" de tais comportamentos? No domingo 17/06 um autocarro transportando cerca de 50 activistas alemães de regresso a casa foi mandado parar e a polícia comportou-se brutalmente e provocatoriamente, felizmente os activistas não perderam o sangue-frio. Podia multiplicar as situações relatadas no indymedia.org da Suécia ou de outras fontes. Sei que está em preparação um livro sobre o que realmente se passou em Gotemburgo, organizado por universitários, de modo a coligir os factos, com provas fotográficas e com testemunhos das mais diversas proveniências.
Os meios ao serviço do capitalismo vão tentar, estão tentando, fazer crer que se trata de hooligans, sedentos de violência. No entanto, objectivamente, não só omitem totalmente os pontos de vista dos militantes anticapitalistas como estão permanentemente a construir "análises" que induzem o leitor não prevenido em erro. Isto chama-se propaganda, chama-se facciosismo. Não têm nada de democrático. Os povos têm toda a legitimidade para manifestarem nas ruas o seu descontentamento pela forma como os políticos no poder, nos diversos países da U.E:, estão levando a uma construção belicista, apoiada do grande capital financeiro, fazendo tábua-raza de todas as garantias e protecções sociais, desmantelando toda a legislação laboral a pretexto de "flexibilidade" (=maximização dos lucros, etc).Ultimamente, cauí-lhes a máscara por duas vezes, ao calarem qualquer protesto pela inclusão do neo-fascista Fini como número dois do governo Berlusconni, ao ficarem histéricos com o NÃO irlandês ao tratado de Nice!
Se é o Senhor José Manuel Fernandes, ele próprio, que colocou o seu próprio editorial no azine, pergunto-lhe muito directamente, será capaz de colocar esta minha resposta em local equivalente no jornal de que é director?

--------------------------fim de texto-

Cada uma das respostas neste site faz-me crer que a minha primeira impressão sobre o Zé Manel foi o mais precisa possível. Mais uma vez fica o apelo, vão ao site e leiam TUDO, TODAS as respostas. E reflitam. Muito.

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