segunda-feira, setembro 03, 2007

e tinham-me dito que ler era o caminho para saber escrever

às vezes escrever parece-me redutor. pelo menos nestes tempos em que escrever já não é "tão natural como a minha sede". quando comecei a escrever, contavam-se pelos dedos de uma mão (não necessariamente com 5 dedos) os livros que tinha lido. em pequeno, os meus pais insistiam que as minhas leituras obrigatórias, aos 7 anos de idade, deveriam ser as obras de Camilo Castelo Branco ou os "Deuses e Demónios da Medicina" (com jeito marcava logo ali o objectivo de entrar em Medicina). provavelmente reside aqui a causa de tamanho afastamento da literatura.

mas ao mesmo tempo, incrivelmente e ainda que sem ter lido nenhuma daquelas obras, escrever tornou-se um vício. não sei bem porquê e, sinceramente, não me parece que algum dia venha a conseguir a resposta a isto. adorava escrever. adorava comprar cadernos novos, com o Patinhas ou as Tartarugas Ninja na capa, e com dizeres típicos dos anos 80 ("Surf Up!", "Cool Style"), adorava riscar as folhas todas com rabiscos e meios rabiscos, fazer corações com dedicatórias que nunca chegavam ao destinatário e, eventualmente, sentava-me a escrever grandes estórias. lembro-me que na primária acabava os testes o mais rápido possível para poder escrever a maior composição possível, para tentar bater o meu recorde de folhas A4 extra que pedia à professora para completar as minhas estórias e de me sentir muito realizado com a cara incrédula que ela fazia, convencido que depois de as ler ela certamente deliraria com os meus devaneios. pelos vistos, para a idade, até devia ter um certo jeito para a "coisa"; as minhas professoras começaram a incentivar a minha escrita ao longo dos anos e passado tanto tempo ainda hoje quando me vêem perguntam se continuo a escrever e contam como guardam ainda alguns dos meus textos da altura.


quando comecei a escrever aqui, e ocorria situação semelhante à atrás descrita, sentia-me orgulhoso e de certa forma um privilegiado por estar tão à vontade com a escrita sem nunca ter feito nada por isso.

mas entretanto resolvi começar a ler. e a ler bons textos, diga-se de passagem. dos livros aos ensaios aos romances e às intervenções e análises, apaixonei-me e abri os olhos: eu de facto não escrevo uma merda. e escancaradas que estavam as portas da ignorância, li mais e mais e mais, em busca da "salvação", de resolver o meu tormento, mas quanto mais lia mais percebia o pouco jeito que tinha para a coisa. hoje quando as professoras da minha infância, com os seus perfumes antigos e óculos pesados, se dirigem a mim eu faço de conta que sou outro. que não sei quem são e que esta insegurança não é minha. mas isto era para ser um post sobre a insegurança. e acabou por não ser.


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